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A cobrança do ICMS na energia solar fotovoltaica, ‘taxação do sol’

A Assembleia Legislativa de Mato Grosso promulgou em 06/07/2021 a Lei Complementar nº696/2021 isentando do ICMS, até 31 de dezembro de 2027, as operações de circulação de energia elétrica, sujeitas a faturamento sob o Sistema de Compensação de Energia Elétrica de que trata a Resolução Normativa nº 482/2012-ANEEL.

O projeto de lei havia sido vetado pelo Governador, mas esse veto foi derrubado em 30/06/2021 pela Assembleia Legislativa.

A aludida isenção já está prevista no Convênio ICMS 16/15, mas não se aplica “ao custo de disponibilidade, à energia reativa, à demanda de potência, aos encargos de conexão ou uso do sistema de distribuição, e a quaisquer outros valores cobrados pela distribuidora”.

A referida lei complementar estadual, no entanto, ao não se reportar ao mencionado convênio, terminou por estender a isenção sem as restrições impostas pelo convênio, mormente aquela concernente à cobrança da tarifa pelo uso do sistema de distribuição da energia.

A ANEEL reduziu de 100 para até 75kW a potência instalada no caso dos micro geradores, e ampliou a potência limite para sistemas de mini geração distribuída para até 5 MW, mas o texto do convênio não foi ainda atualizado com a alteração dos mini geradores, ficando a dúvida se teria ele recepcionado, ainda que tacitamente, tal revisão.

A isenção com base nesse novo limite, fixado pela Resolução modificadora, já é legitimamente concedida pelo estado de Minas Gerais, bem como pelo estado do Rio de Janeiro.

O Supremo Tribunal Federal em inúmeras decisões já assentou a inconstitucionalidade da concessão de benefícios fiscais no âmbito do ICMS, sem a prévia aprovação pelo CONFAZ, por meio da celebração de convênio aprovado por unanimidade por todas as unidades da federação, como é o caso agora da LC 696/2021 de Mato Grosso.

Nesse sentido, com acréscimo do entendimento de existência de violação à Lei de Responsabilidade Fiscal, a qual preconiza que a concessão de qualquer incentivo fiscal de que decorra renúncia de receita pelos estados, torna necessária a previsão orçamentária do impacto financeiro correspondente, a ser acompanhado de demonstração de que as metas de resultados fiscais não serão afetadas ou de medidas de compensação que proporcionem aumento de receita, foi a decisão monocrática do Conselheiro do Tribunal de Contas de MT, Valter Albano, ao conceder “medida cautelar de urgência para determinar ao Exmo. Governador do Estado de Mato Grosso e ao Sr. Secretário de Estado de Fazenda que mantenham a cobrança do ICMS sobre a TUSD/TUST dos micro e minigeradores de energia elétrica, nos termos do Convênio CONFAZ 16/2015”.

Esse Julgado teve seus efeitos sustados pelo Decreto Legislativo 66, de 19/07/2021 (DOAL de 21/07/2021).
O governador informa que está buscando a (difícil) aprovação do benefício fiscal pelo CONFAZ.

A PGE, em descompasso com o que havia externado o Procurador-Geral do Ministério Público de Contas na representação que encaminhou ao TCE, por entender que a ação não teria cabimento na hipótese vertente, destacadamente porque a energia injetada no sistema de distribuição pela unidade consumidora teria apenas caráter de empréstimo, o qual, contudo, só foi inserido na definição de sistema de compensação de energia elétrica após a edição da Resolução da ANEEL nº

687/2015.

Tais justificativas, entretanto, desconsideram aspectos que parecem relevantes, tais como: a) o de que a tarifa pelo uso do sistema de distribuição e transmissão de energia elétrica ostentaria natureza tributária, matéria atualmente sob apreciação do STJ; b) a existência de ofensa à lei de responsabilidade fiscal e c) o que prescreve o art. 4º do Código Tributário Nacional, segundo o qual “a natureza jurídica específica do tributo é determinada pelo fato gerador da respectiva obrigação, sendo irrelevantes para qualificá-la: I – a denominação e demais características formais adotadas pela lei e, II – a destinação legal do produto da sua arrecadação”.

Diante de tudo isso fica dúvida quanto a um casual pedido de repetição de indébito de valor que foi cobrado pela distribuidora, e quanto ao verdadeiro alcance da isenção na forma preconizada pela LC 696/2021, bem como das consequências que adviriam de posterior questionamento por parte de qualquer outro legitimado da constitucionalidade do benefício fiscal, ou até mesmo em eventual ação popular.

Juliana Bueno é advogada tributarista especializada em Direito Tributário, ex-assessora do Tribunal de Contas e da Procuradoria Geral do Estado de MT.

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