Prestes a completar duas décadas, o Fundo Estadual de Transporte e Habitação de Mato Grosso (Fethab), imposto que incide sobre commodities agrícolas e óleo diesel, continua sendo motivo de discussões políticas, ações jurídicas e também muita desinformação. Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, são os únicos Estados que taxam o agro no Brasil.
imposto teve seu início de vigência em 29 de março de 2000, criado pelo então governador Dante de Oliveira através da Lei 7.263/2000, com objetivo de investir o recurso gerado em logística e habitação. Ao longo desses quase 20 anos que sucederam, novas cobranças foram incorporadas e, mais recentemente, parte do que é arrecadado passou a ser destinado a outros setores, como educação, saúde, segurança pública e assistência social.
Os produtores rurais, ao longo desses anos, reclamam que são taxados e, mesmo assim, rodam por estradas de chão precárias, sem infraestrutura capaz de suportar o escoamento da produção. Esse cenário se soma com os custos de transporte que historicamente são maiores no Mato Grosso, por estar geograficamente longe dos portos. Por outro lado, começaram a aparecer discursos de políticos e lideranças não ligadas ao agro, de que produtores estão se tornando barões e que se beneficiam de isenções, como o ICMS.
Ações judiciais contestando a cobrança, ou mesmo exigindo que o recurso seja investido exclusivamente em estradas, também são recorrentes. Mais recentemente, a Sociedade Rural Brasileira (SRB) entrou com uma ação na justiça contestando o Fethab. Para a entidade, que congrega produtores rurais de todo o país, esse imposto aumenta o custo dos produtores mato-grossenses.
Já os governos que passaram pelo Palácio Paiaguás ao longo desses 20 anos, atestam que o Estado não tem como se manter sem o Fethab, por ter na agropecuária sua principal atividade econômica. Diante de polêmicas e desinformação, é necessário que o fluxo de arrecadação e rateio dos recursos seja entendido.
Entendendo o Fethab
A AGRNotícias, com base em dados coletados junto à SINFRA (Secretaria de Estado de Infraestrutura e Logística), produziu um infográfico para explicar como funciona os diferentes percentuais de arrecadação e o rateio dos recursos arrecadados pelo fundo.
60% do Fethab I e II, que envolvem as commodities, vai para educação, saúde, segurança pública e assistência social. 30% vai para investimentos pela Secretaria de Infraestrutura e 10% para o MT PAR.
Do Fethab óleo diesel, 50% fica com o Governo – onde é rateado pelos poderes, e 50% é dividido entre os 141 municípios de Mato Grosso. O rateio leva em consideração diversos critérios técnicos, como, por exemplo, a quantidade de quilômetros de estradas estaduais não pavimentadas. A título de exemplo, o município de Cáceres-MT, que não figura entre os maiores produtores agrícolas do Estado, foi o quinto que mais recebeu recursos oriundos da arrecadação do Fethab do Óleo Diesel em 2019 (R$ 3,5 milhões).
Municípios da região do Araguaia
Dos quase 2 bilhões de reais (R$ 1.937 bi) arrecadados em 2019 com todo o Fethab, R$ 579 milhões vieram do Fethab óleo diesel. Desse montante, 50% foi destinado para os municípios. A informação é da SEFAZ (Secretaria de Estado de Fazenda de Mato Grosso). Somente em janeiro de 2020, o Fethab total arrecadou R$ 341,5 milhões no Estado.
Do Óleo Diesel, no Vale do Araguaia, no ano de 2019, Água Boa-MT recebeu R$ 2,124 milhões, Canarana-MT R$ 2,313 milhões, Querência-MT R$ 2,367 milhões, Gaúcha do Norte-MT R$ 1,713 milhão, Nova Xavantina-MT R$ 1,789 milhão, Ribeirão Cascalheira-MT R$ 2,209 milhões, Barra do Garças-MT 1,842 milhão e Confresa-MT R$ 2,240 milhões. Esse recurso precisa ser investido em conservação de estradas, embora os prefeitos afirmam ser insuficiente.
Fethab sobre a soja
A AGRNotícias também conseguiu fazer uma estimativa de quanto os produtores de dois municípios do Vale do Araguaia pagariam de Fethab por ano somente sobre a soja. Não existem dados oficiais de quanto cada um dos 141 municípios gera de Fethab individualmente sobre todas as commodities e o óleo diesel. Somente arrecadação total, devido a forma como ocorre o recolhimento.
Cada produto incidido pelo Fethab tem uma porcentagem da UPF, que é a Unidade Padrão Fiscal do Mato Grosso, que em fevereiro de 2020 era de R$ 148,98. A soja, por exemplo, maior commodity da maioria dos municípios produtivos, tem a incidência de 20% da UPF por tonelada transportada, sendo 10% do Fethab I e 10% do Fethab II, que dá R$ 29,796 por t/soja, R$ 1,78776 por sc/soja e R$ 0,029796 por kg/soja.
Num cálculo simples, foram produzidas em Canarana, por exemplo, no ano de 2018, conforme dados do PAM do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), 841.500 mil toneladas de soja. Essa produção vem aumentando a cada ano, mas considerando esses números, considerando os valores da UPF de fevereiro, os produtores do município pagariam R$ 25.073.334 milhões de Fethab soja em 2020 pela mesma produção. Querência produziu 1.176.000 milhão de toneladas de soja em 2018, o que geraria R$ 35.040.096 milhões de Fethab soja.
Vale salientar que a soja que vai para exportação não paga Fethab. Não se tem os números da porcentagem, por exemplo, da produção de Canarana e Querência que foram exportadas.
Enquanto isso…
O presidente da Aprosoja/MT (Associação dos Produtores de Soja e Milho do Mato Grosso), Antonio Galvan, diz que nenhum cidadão gosta de pagar imposto. Para ele, a maior reclamação dos produtores, é pagar a taxação, mas mesmo assim rodar por estradas sem condições. “A verdade é que ele foi criado com um objetivo que nunca foi cumprido por governante nenhum, na colocação do recurso na infraestrutura […] Se o governo pegasse esse recurso e jogasse todo ele na infraestrutura, ainda viria reclamação de alguns, mas tenho certeza que o produtor que tivesse a rodovia dele pavimentada, a reclamação não aconteceria […] Por isso, a grande maioria hoje não aprova o pagamento”, disse Galvan.
Enquanto os produtores lutam para não pagar o Fethab, ou pelo menos, que a destinação seja exclusiva para melhoria da logística, cada prefeitura, cada secretaria estadual e cada um dos poderes de Mato Grosso, lutam por uma fatia maior do rateio, ou até para que o bolo aumente. Uma discussão que já vem há duas décadas e que vai continuar, sendo que para o produtor rural mato-grossense, a esperança sempre fica a cargo do próprio suor.
Por AGRNotícias. Infográfico – Danymeire Carvalho. Fotos AGR. Foto Capa: Cely Trevisan.